CF Estrela: Entrevista ao presidente Rui Silva
Portugal Sport: Como é do conhecimento geral, o Estrela da Amadora passou por várias transformações ao longo da última década e meia. De que forma podemos resumir o percurso do Estrela e a posição do clube atualmente?
Rui Silva: O clube foi fundado em 1932 e fez o seu percurso. Teve o momento mais glorioso em 1990 com a conquista da Taça de Portugal no futebol. Noutras modalidades já tínhamos atingido patamares elevados. Depois vem o período negro. O clube entra em insolvência e a administração cai por causa das dividas, que levam o clube a ter de fechar portas.
Nesse período negro, os sócios afastaram-se do clube. Ainda competimos na 2ª divisão, que seria hoje o Campeonato de Portugal e foi o último ano de sénior que fizemos. Depois só tínhamos a formação, até encerrar por completo.
Por volta dessa altura alguns sócios como eu, que gostavam muito de desporto, de futebol e sendo do Estrela, ficaram órfãos de clube. Pouco antes, esses sócios, onde me incluo, criamos o movimento “Sempre Tricolores” e foi esse movimento que refundou o clube, através da criação de uma associação desportiva em 2011. Como não podíamos dar um nome igual, criamos o Clube Desportivo Estrela. E lançamos as bases para o que somos atualmente.
Criamos um símbolo, parecido com o atual. Mais tarde adquirimos o símbolo do Estrela, que caducara. Mantivemos o nome novo e começamos com a formação, não no José Gomes, que faz parte da massa insolvente. Daí a se dizer que o estádio esta à venda. Ano por ano íamos acrescentando escalões até ter seniores, na terceira divisão distrital.
Em 2020, tínhamos um contrato com a massa insolvente que se atualiza ano a ano, mas que era um problema para projetar algo mais a longo prazo. Dessa forma juntou-se a nós um investidor que propôs uma fusão entre o Sintra e o CD Estrela. O Sintra não tinha capacidade para prosseguir além do Campeonato de Portugal e o Estrela estava nesta situação frágil e também não poderia progredir muito mais. Os clubes fundira-se. O Estrela assumiu o lugar do Sintra no Campeonato de Portugal e o investidor propôs-se a adquirir o estádio para o Estrela.
Com a fusão dos clubes, assumimos o nome Clube de Futebol Estrela e criamos uma SAD. Consideramos a refundação em 2011, quando criamos as bases da instituição. Não há um renascimento em 2020 como se diz por ai, tudo isto é o Estrela da Amadora. O nosso ano é o 1932. O clube teve várias mudanças ao longo dos anos, desde o nome, estádio, cores, mas a raiz é sempre a mesma: 1932.
PS: Em todo este processo, como tem sido a ligação do clube com os adeptos?
RS: Tem sido mais evidente a partir do momento em que criamos os seniores. Os adeptos não seguiam a formação. Começaram a seguir quando criamos a equipa sénior. Basta ver a enchente em janeiro de 2019, quando jogamos com o Belenenses, no distrital de Lisboa.
Com os seniores, temos mais sócios, vem mais pessoas, temos a satisfação das pessoas em ver o Estrela de volta e nos dias de hoje temos a parte da cobrança. A parte da responsabilidade. Os sócios são mais exigentes para com o Estrela quando perde um jogo.
Há que salientar que neste momento é a SAD que está com o futebol sénior. O clube dedica-se às modalidades e à formação. Olhando como adepto, tenho o sonho de ver o Estrela a aproximar-se do seu lugar, que é na primeira Liga. Quando chegamos ao Campeonato de Portugal, achei que com duas equipas a subir, num total de 96 equipas, que seria uma tarefa tremendamente complicada. Fui surpreendido pela positiva por ter conquistado essa subida à Liga . É o regresso aos campeonatos profissionais e fiz questão de receber a equipa na rua como um adepto.
PS: A pandemia da COVID-19 tem causado inúmeros prejuízos e a perda de sócios tem sido uma evidência na maioria dos clubes portugueses. O Estrela conseguiu de alguma forma manter o número base de associados do clube?
RS: Antes de falar dos sócios, tenho de referir que o impacto financeiro não foi violento. O clube não tem dividas, houve uma diminuição da receita, uma vez que uma parte da receita são as mensalidades da formação. E sem competição não cobramos mensalidade. Com a equipa a competir e a vencer no Campeonato de Portugal, mesmo em pandemia juntaram-se mais sócios, portanto fomos ajudados nesse sentido.
Apesar da subida no clube, que pertence à SAD, o ano desportivo na formação foi muito mau. Teve impacto no próprio clube, tal como em todos. Os atletas da formação de hoje e seniores de amanhã sofreram muito com este período. O atleta tem dois anos por escalão e há um ano que eles perderam. E esse ano vai ter reflexos. Quando não sei, mas efetivamente vai ter. E por mais incentivos que os nossos treinadores sejam, não podem evitar este retrocesso. É um caminho difícil de recuperar e terá consequenciais maiores do que o impacto da pandemia no número de sócios.
PS: Há 15 anos atrás, quando o Estrela da Amadora disputava os profissionais, existia nos clubes da primeira Liga a política de contratar em massa jogadores estrangeiros, privilegiando o atleta de fora do que propriamente o jogador português e da formação. Hoje alguns clubes e as seleções jovens começam a recolher frutos de uma aposta contínua na formação de jogadores. Qual é a posição do Estrela na questão do aproveitamento da formação?
RS: Nós trouxemos connosco uma ideia que pode ser um pouco utópica, mas são os sonhos que nos levam a tomar decisões num determinado rumo. A equipa sénior na nossa ótica devia ser constituída na sua maioria por atletas formadas no clube. Não sei se isso é possível de acontecer. Temos um clube e uma SAD nos seniores, que se guia por outros parâmetros que não o da própria formação. Mais da aquisição e venda de jogadores. Da otimização de resultados no global.
A visão que temos do clube sempre foi utópica. Temos uma ideia para o Estrela que passa por manter os atletas da formação. Queremos que os jogadores que surgem nos benjamins, cheguem aos iniciados, juniores e que vão até aos seniores. É uma ideia que temos por principio e que queremos construir dentro do clube. É um caminho difícil, mas é o mais natural.
PS: Hoje quais são as modalidades presentes no clube e de que forma o Estrela irá voltar a ser eclético?
RS: Além do futebol, temos ténis de mesa em competição e o atletismo em vertente popular. Eu sou atleta desta última modalidade e um dos elementos mais jovens. Nesta fase queremos nos focar na formação do atletismo.
Tivemos em 2011, na refundação, como principio resgatar modalidades históricas do clube, como o judo, o rugby, etc. Mas também não temos palas nos olhos e claro que temos portas abertas para modalidades totalmente novas no clube. Quem me dera ter basquetebol ou andebol no Estrela hoje em dia..
Apostar no ecletismo significa que acreditamos que o desporto é importante para formação de uma pessoa. Um miúdo além de fazer a escola, deve te ruma componente desportiva e outra artística na sua vida. O desporto torna-nos mais saudáveis As artes também são importantes. Ajuda-nos a abrir a cabeça e a mente.
Quantas mais modalidades existirem, maior é o incentivo para as crianças praticarem de desporto. É muito importante praticar o desporto que se gosta mais.
PS: Olhando para a próxima temporada, o que podemos esperar do Estrela em 2022?
RS: Conseguir algo que ambicionávamos há algum tempo, poder subir de divisão e ir até aos nacionais com todas as equipas do futebol de formação. Se possível já neste próximo ano. E criar mais modalidades. As novas modalidades tem de ser financeiramente sustentáveis, mas também tem de ter formação.
Temos propostas de modalidades e nós dizemos exigimos sempre o mesmo: que a modalidade seja de competição, federada, que seja sustentável financeiramente e que tenha formação.