“A Ovarense faz falta à Liga BPI”
Entrevistado: Carlos Santos, diretor desportivo da equipa feminina da Ovarense
Portugal Sport: Os investimentos da FPF para fomentar o futebol feminino em Portugal são claros. Como diretor desportivo da equipa feminina da Ovarense, que análise é que o Carlos faz em relação a esses mesmos investimentos?
Carlos Santos: A federação está a ajudar os clubes nessa evolução e só assim é que faz sentido. Se formos ver a nível nacional, antigamente havia pouco mais de cinco equipas e hoje se for preciso existem 500. E só com a ajuda da Federação e com os apoios que eles vão dando é que vai ser possível dar continuidade a esse crescimento.
Estamos no caminho certo, ainda falta muito para termos a qualidade de jogo e a mesma presença de adeptos do masculino, mas só com esses apoios é que vamos conseguir diminuir o fosso.
PS: Mais clubes vão seguir o seguir o exemplo do Estoril Praia e do FC Famalicão em relação ao futebol feminino?
CS: Sim, sendo coisas diferentes. Na nossa realidade, não temos uma SAD a investir no futebol masculino ou profissional, e todas as responsabilidades caem sobre o clube. O FC Famalicão tem a SAD a investir no futebol masculino e o clube pode-se dedicar totalmente ao feminino. Nós aqui temos de gerir todas as equipas. Procuramos valorizar o povo da terra e crescer dessa forma.
PS: O que mudou esta temporada, em comparação com o ano da descida?
CS: A época passada não correu nada bem. Fizeram-se investimentos que não trouxeram resultados em campo e acabaram com a descida de divisão. Este ano traçamos um projeto, ficamos apenas com três jogadoras da época transata. Fomos recrutar mais de vinte jogadoras e foi um começar do zero. Como principal foco temos a formação, estamos a crescer nesse aspeto, e passa muito por aí. Vamos crescer na formação, para alimentar a equipa sénior, que queremos que suba à Liga BPI.
PS: Quantas equipas de formação tem atualmente?
CS: Apenas sub-19. Tivemos um crescimento de número de atletas, mas ainda não estamos satisfeitos e para o ano queremos ter ainda mais atletas. Possivelmente vamos deixar de competir no futebol de sete e avançar para o de nove ou até abrir um novo escalão de formação.
PS: É difícil captar atletas para uma equipa feminina de futebol?
CS: O nosso foco não é tanto o recrutamento, mas sim a angariação. Não queremos ir buscar jogadoras ao vizinho, mas sim criarmos as nossas atletas, através da jogadora da escola, do bairro, e aí sim, vamos conseguir aumentar em número de atletas. E é o caminho a seguir. Se os clubes estiverem preocupados em ir buscar jogadoras aos adversários, então vamos estar sempre a trabalhar num mercado muito reduzido.
As pessoas em Ovar gostam da Ovarense, por isso ao irmos ao bairro, às escolas, se fomentarmos o futebol feminino, as miúdas vão começar a aparecer na modalidade.
PS: Em termos culturais, qual é a relação dos adeptos com a equipa de futebol feminino?
CS: É normal preocuparem-se mais com o masculino, porque a mentalidade cultural dos portugueses assim o obriga. No entanto, temos sempre boas casas, e arrisco-me a dizer que da segunda divisão atual, somos a equipa com mais adeptos quando jogamos em casa.
PS: As jogadoras são maioritariamente de Ovar?
CS: Temos duas atletas do concelho de Ovar, temos três estrangeiras, depois vem quase tudo do Porto. O nosso treinador é de Braga e trabalhamos muito o mercado do norte. Aqui à volta é mais difícil captar porque a descida de divisão trouxe alguma instabilidade. Temos também o Albergaria ao lado que está na liga BPI e é difícil competir com isso.
PS: Que balanço faz desta temporada e quais são os objetivos para 2022/2023?
CS: Foi uma época de mudança. Queremos para o ano manter a base desta temporada e aumentar a formação. Em breve temos de estar na Liga BPI. Com a estrutura que estamos a criar vamos ter condições para isso e a Ovarense faz falta à Liga BPI.
PS: Na próxima temporada vamos ter jogadoras dos sub-19 a transitar para a equipa sénior?
CS: Este ano tivemos a Maria que tem 15 anos que já marcou um golo. Faz parte regularmente da equipa sénior. E vamos continuar por ai. Vamos ter uma ou outra jogadora da formação que para o ano serão apostas do clube.
PS: A profissionalização das equipas vai tornar a subida mais difícil a cada ano que passa?
CS: Cada vez mais difícil. Os resultados de 10-0 na segunda divisão já não existem. Os jogos são muito equilibrados, há uma equipa com maior investimento que pode ter mais vantagem, mas está tudo muito equilibrado.
PS: Em 10, 15 anos, teremos uma liga BPI totalmente profissionalizada?
CS: Sim. Acredito que o futuro vai ser esse. E não vamos ter de esperar tanto tempo. Com a entrada de mais patrocínios e de direitos televisivos, a liga BPI vai ser completamente profissional. E a redução número de equipas por parte da Federação torna esse objetivo claro.